Tiro pela culatra
Em épocas eleitorais, muitas campanhas começam a ser propagadas na mídia. Escândalos são desvendados, projetos são colocados para aprovação na câmara em regime de urgência, fala-se em extinguir o salário do vereador ou equipara-lo ao salário de outro profissional.
A população é envolvida como cordeio no ataque a classe política: xinga e reclama. Pouco se sugere, pouco se transforma. O monólogo que costuma ocorrer nos espaços públicos, vira interesse de muitos. Muito embora, poucos queiram a responsabilidade de legislar em suas costas.
Creio que, o que aconteça é a confusão entre política e politicagem, ambas, no mesmo balaio compõem a realidade que temos hoje: uma sociedade de pessoas apáticas politicamente, totalmente servis. Muitos pensadores já alertaram que o analfabetismo político representaria um grande cárcere para o homem social:
“O pior analfabeto é o analfabeto político. Ele não ouve, não fala, nem participa dos acontecimentos políticos. Ele não sabe o custo de vida, o preço do feijão, do peixe, da farinha, do aluguel, do sapato e do remédio dependem das decisões políticas. O analfabeto político é tão burro que se orgulha e estufa o peito dizendo que odeia a política. Não sabe o imbecil que, da sua ignorância política, nasce a prostituta, o menor abandonado, e o pior de todos os bandidos, que é o político vigarista, pilantra, corrupto e lacaio das empresas nacionais e multinacionais.” Bertolt Brecht
Doa ou não, os políticos de hoje são reflexo da realidade da nossa sociedade, de nós mesmos. Por mais difícil que seja aceitar, eles são seres humanos como nós: alguns com mais virtudes, outros menos.
Sim, concordo que o sistema político brasileiro não colabora muito em relação ao desenvolvimento da nossa consciência política, mas, não podemos deixar de alarmar que: esse amadurecimento deve ser humano! Não existe mudança estrutural que não perpasse pela mudança do homem. E se hoje somos governados por uma classe que não nos representa, é válido um profundo exame de consciência.
Eu, como a maioria dos brasileiros provavelmente não colaboro para que se tenha em nosso país um sistema democrático, livre da vontade de poder de cada um e mais ético. Nosso sistema político antes de ser corrupto, inconfiável e prostituído, não é respeitoso com a nossa própria capacidade de discernimento e desenvolvimento, enquanto ser humano.
Cada dia que passa, tenho mais certeza de que, a saída seja: sermos mais! E isso só é possível com um sistema educacional eficiente e a disposição das pessoas em aprender e participar.
A equiparação salarial do vereador a de um professor, por exemplo, vamos supor que fosse colocada em prática, resolveria a nossa crise moral e ética¿ Quando ouço discussões como esta se propagarem tão rapidamente, ganharem capa de jornal, me pergunto: até que ponto estamos dispostos a mexer no cerne do problema¿ Estamos, enquanto sociedade, ou mesmo enquanto, Câmara Municipal de Vereadores dispostos a monopolizar a nossa preocupação política na discussão de cargos e salários¿
É uma conversa perigosa e demagógica, uma redução simplista, clichê e preguiçosa, da calamidade pública que é hoje a confiança dos eleitores em seus representantes. E que ao invés de vir a ajudar, pode deixar pior, o que já não estava bom.
Veja: os professores são importantes, os demais servidores também o devem ser. Quando se pensa na redução do salário dos vereadores, se remete ao reconhecimento que a população tem da capacidade representativa dos mesmos, diante da população.
Uma das dificuldades da representatividade política advém do eleitor, que muitas vezes desconhece o papel do vereador e os efeitos do seu voto. Se não se está contente com a composição da Câmara e consequentemente se acredita que, “o investimento em salários é incompatível com os resultados obtidos”, seria hora de pensar em como atrair para este cargo pessoas mais capacitadas e comprometidas com a causa pública, não esquecendo que bons salários são atrativos para pessoas mais qualificadas.
Sugerir medidas como esta é valorizar a tentativa de reduzir a importância do poder legislativo, que para o povo deve ser relativamente o mais influente, justamente por representa-lo e legislar a seu favor.
Um “tiro pela culatra”.